Tempo de Solidão

"Tempo de solidão, tempo de exílio."

sexta-feira, janeiro 21, 2005

É tão simples

Pode começar amanhã, para a semana ou pode nunca ocorrer. Apenas sei dizer que se decidires perceber, conseguirás fazê-lo. Sou um livro aberto, sou um mar de emoções à flor as palavras e dos gestos. Sei esconder-me, sei dissimular-me, sei colorir-me, mas não consigo disfarçar o que sinto por ti. Não de ti.

Basta decidires que me queres ver, e ver-me-ás. Até agora tem sido a tua vida e a tua felicidade a proteger-me, a desviar a tua atenção, mas a cada dia cresces mais curiosa, mais interessada. Intrigo-te, eu sei. Tenho algo que ainda não descobriste mas que sabes que é integral para a minha caracterização como pessoa. E incomoda-te não saberes o que é, irrita-te que eu não to revele.

Nada poderia ser mais simples do que a minha descodificação. Tenho medo do dia em que me tentes compreender, pois essa será a hora em que nem a minha mais dissimulada actuação evitará que descubras o quanto eu te amo.

Sou uma equação fácil, no fundo. Sou sentimento e emoção a toda a hora e só basta adicionares as minhas partes para encontrares a minha paixão.

sábado, janeiro 15, 2005

"Biografia de alguém que nunca teve vida"

De facto, eu não tenho emenda.

Então não é que comecei a reler o "Livro do Desassossego" anteontem? Peguei nele por necessidade, por sentir que, mais uma vez, tinha chegado a hora de me cobrir com as suas palavras inquietas e sentimentos gémeos. Mais uma vez tinha sentido a falta de toda aquela solidão vertida eximiamente em palavra e símbolo.

E lembro-me que, no ano passado, voltei a pegar no livro por esta altura, provavelmente tal como acontecera um ano antes. É quase como se tivesse alguns livros irremediavelmente associados a certos meses. Não sei se me deva assustar mais com isto ou com o facto de estar a viver anos de emoções cíclicas. A minha vida não passa, apenas se repete.

Seja como for, é complicado descrever o que sinto quando leio esta obra. Por um lado, sinto-me quase privilegiado por ser este pequeno português que sou e conseguir ler esta língua tão difícil. Uma vez peguei na tradução inglesa do Livro e lembro-me de ter ficado muito triste por todos os leitores do mundo que nunca conseguiriam compreender e entranhar a verdadeira espiritualidade desta obra. As ideias passam, as formas quebram-se, e isso sucede para todos os livros. Mas até que ponto é que um livro vindo do fundo da alma, forjado pelo cansaço, desmaterialização, pela vida e pela monotonia, um livro resultante de um punho de genesíaco devaneio, até que ponto é que uma temível obra como essa pode ser compreendida plenamente sem a integralidade das suas estruturas formais?

Por outro lado, e falando do Livro em si, são numerosas as situações descritas e os sentimentos elencados que não me dizem nada, no sentido de nunca os ter conhecido ou de nunca neles ter meditado. Mas assim que os leio, sinto-os, vivo-os, empresto-os por dias a fio. É por isso que nunca me faz bem ler esta lindíssima obra, e é por isso que eu não tenho emenda ao pegar nela sempre que me encontro neste estado de espírito.

Outra ideia, ainda: se há palavras para descrever algo, e o mesmo conjunto de vocábulos consegue exprimir na perfeição algo de muito diferenciado, não teremos encontrado as Palavras Universais da nossa vida? Este livro está cheio de mim...

E, finalmente, ao percorrer esta obra do desassossego, encontro certas coisas que poderia ter eu escrito, se ao menos soubesse escrever...

"Amo, pelas tardes demoradas de verão, o socego da cidade baixa, e sobretudo aquelle socego que o contraste accentua na parte que o dia mergulha em mais bulício, a Rua do Arsenal, a Rua da Alfandega, o prolongamento das ruas tristes que se alastram para leste desde que a da Alfandega cessa, toda a linha separada dos caes quedos - tudo isso me conforta de tristeza, se me insiro, por essas tardes, na solidão do seu conjucto. Vivo uma era anterior áquela em que vivo; goso de sentir-me coevo de Cesário Verde, e tenho em mim, não outros versos como os d'elle, mas a substância egual à dos versos que foram d'elle.
(...)
Mas ha mais alguma cousa... Nessas horas lentas e vazias, sobe-me da alma à mente uma tristeza de todo o ser, a amargura de tudo ser ao mesmo tempo uma sensação minha e uma coisa externa, que não está em meu poder alterar. Ah, quantas vezes os meus próprios sonhos se me erguem em cousas, não para me subsistituirem a realidade, mas para se me confessarem seus pares em eu os não querer, em me surgirem de fóra, como o electrico que dá a volta na curva extrema da rua, ou a voz do apregoador nocturno, de não sei que cousa, que se destaca, toada arabe, como um repuxo subito, da monotonia do entardecer!"

sábado, janeiro 08, 2005

Assunções...

Acredito que há mais musicalidade num suspiro e num sussurro deitados ao vento do que numa palavra directa. Que há mais ternura numa palavra encerrada no mistério do que a mais viva das declarações. Que o amor pode surgir em todo o lado, e que, seja qual for o seu destino, toma as rédeas de todos.

Creio que não é preciso saber para amar, nem conhecer para ser amado. Há mais amor secreto e verdadeiro do que se pode pensar, e tolos somos todos por não vermos isso todos os dias. Acredito que nunca serei feliz no amor, mas que isso não é razão para deixar de amar. A paixão não existe devido a um fim, a um objectivo. Simplesmente, existe, e não há nada que eu possa fazer senão vivê-la.

Acredito que o que o meu amor conta.

Acredito que é um prazer e um consolo amá-la sem que ela se aperceba. Como seria bom saber que cada um de nós tinha alguém com quem sempre poderá contar e que nunca deixará de emanar a sua ternura! Mas também, se não soubermos, não é por isso que vai deixar de haver ternura, e é por isso que é um verdadeiro mim e consolo amar incógnito. Estou lá, e mesmo que ela não saiba, lá estou.

Em tudo isto acredito, mas nada disto sei. O meu coração só conhece o presente e o que sentiu, e a minha mente apenas projecta idealizações para o futuro. Talvez o amor não seja nada disto, talvez seja simples e fácil, ou desinteressante e inédito. Tudo isto oiço dizer e tudo isto gosto de imaginar. Um dia virá, talvez, em que eu terei a felicidade ou a miséria de descobrir até que ponto tem razão o meu sentimento.

quarta-feira, janeiro 05, 2005

Inverno

Tenho de arredar esta noção de que sou a pessoa mais indicada para ela. Não sou. Nunca fui. Sempre procurei pensar isso mas afinal de contas, no fundo, bem no fundo, havia qualquer coisa que me individualizava como alguém especial, uma pessoa que a poderia fazer feliz noutras circunstâncias, mais do que ninguém. Uma esperança, talvez um réstia de auto-estima, uma pequenina doce voz que ainda me deixava acreditar em mim e no amor.

Isso é a maior mentira com que me embriaguei durante o último ano. Talvez a maior das mentiras que já usei para me convencer de alguma coisa. E o que mais me assusta é que foi uma mentira inconsciente, uma coisa que eu não consegui controlar. Uma mentira com vontade própria e que, olhando para o meu sofrimento, assumia a compaixão de me consolar.

Sofrer é fácil. É difícil, mas é fácil. Pode haver sempre um consolo em acharmo-nos dignos da solidão e da tristeza por sermos aquilo que somos. Mesmo que eu ame alguém no escuro, alguém sem resposta e sem consciência do meu amor, mesmo que eu sofra e definhe com a solidão que nunca me deixará, pelo menos posso contentar-me pela medida da minha paixão. Posso elencar as formas como a amo, posso descrever os limites insondáveis do meu amor e posso até acreditar que ela, noutras circunstâncias, sentiria por mim o mesmo. Que me devotaria o seu amor por inteiro, na mesma medida e proporção com que eu o faço todos os dias e ela nunca percebe.

Mas isso não é verdade, minha querida, sabemos bem que isso não é verdade. Eu não sou para ti e, se fosse, não te completaria. Nunca mo disseste, mas eu percebo-o na sombra das tuas palavras, leio-o nos teus olhos distantes, compreendo-te. Eu amo-te, como poderia deixar de te compreender tão bem? Foste feita para mim, minha querida, mas eu estou longe de poder ser aquele que mais amarás. Não podemos existir, é verdade...

Desde que me apaixonei que não sinto nada de tão devastador. É um sentimento mais atroz do que o desgosto que transporto em mim constantemente. Falsas esperanças e falsos sentimentos vão e vêem, mas agora sei, sei mesmo, tenho a certeza que ela nunca me amará, e que a minha felicidade, mais uma vez, fica um passo mais distante de mim. É terrível quando a única grande certeza que se possui na vida é uma segurança destas. É tudo o que eu sei agora, é tudo com que posso contar.

Ai, como e quando acabará tudo isto? O que se seguirá no meu mar de tormentas? Estou tão dorido, tão farto, tão triste. Já nem sei se quero amar.

sábado, janeiro 01, 2005

Chegou um novo ano

"Gelaram todas as mãos cruzadas sobre todos os peitos...
Murcharam mais flores do que as que havia no jardim...
O meu amar-te é uma catedral de silêncios eleitos,
E os meus sonhos uma escada sem princípio mas com fim... "



Eis um novo ano, um novo período de grandes esperanças, pequenas esperanças, ânsias e sonhos. Para quem, como eu, vive aterrorizado do futuro e da mudança, não é fácil encontrar um sentimento para este dia.

E no entanto, sem que saiba muito bem porquê, só me consigo lembrar destes versos.