Nada pode ser simples?
Março foi um mês de desgosto.
Sei apontar com toda a precisão o dia que me leva a dizer isso, mas tal é irrelevante para o que quero presentemente exprimir.
Nunca fingi não ser uma criatura de paixões e sensibilidades. Nunca me enganei ao pensar que poderia existir ao longo do meu tempo sozinho, sem amar ou sem admirar. Os anos passaram docemente, deixei de recordar essas honestidades. Depois, subitamente, descobri que estava apaixonado.
Não dirão todos os apaixonados mais insensatos que nunca conheceram tão grande e inflamada paixão como aquela que vivem naquele momento? Não se prontificarão todos a proclamarem a sua maior entrega de alma à musa por quem de momento sentem admiração? E não serão todos eles ridículos e absolutamente desprezíveis por se precipitarem em tão triste leviandade?
Seja. Pois então eu vou correr o risco de me aparentar com eles: vou dizer sem sombra de dúvidas que jamais amei alguém como amo a minha presente amada. E sei que estou certo. Não vou negar que, ao longo da minha curta vida, tenha sentido fortes paixões, com uma em particular a ocupar os meus mais novos anos. De longe, contudo, não as posso considerar muito mais que meras inclinações. Mesmo que eu goste de atribuir a uma delas um papel muito importante e intenso na minha vida, tenho de reconhecer que é só por causa da minha então inexperiência nestas coisas ternas do coração, e da minha tendência abominável de tudo exagerar.
Sem sombra de dúvidas, nunca amei tanto como agora.
E foi em há uns meses atrás, em Março que eu percebi isso, pela maneira como sofria. Sofri uma terrível semana, cheia de pensamentos e desilusões. A boa da minha amada não teve qualquer culpa, fui eu que me senti assim ao perceber que amava uma pessoa muito mais extraordinária do que inicialmente tinha concebido. Foi um tempo em que me apercebi de muitas coisas, em que me fechei durante uns dias e pensei, e senti… No final da semana, numa tarde serena de sexta-feira, elaborei a minha reflexão final. Lembro-me de ter ido ver um filme nessa tarde, de saber bem que isso me ia fazer mal (dada a melancolia dessa particular obra). Depois disso, caminhei durante uns minutos. Comecei a perceber que trazia comigo uma tristeza maior do que tudo aquilo que eu já tinha sentido, e vastamente superior a qualquer forma de expressão que eu pudesse dominar. Sentei-me num pacato jardim, em profundo silêncio. Conseguia ouvir a mágoa a crescer dentro de mim, um desalento indescritível a toldar-me cada intento.
Era….terrível. Sentia-me pesado, com uma dor que me habitava o corpo. Não conseguia identificá-la, não a compreendia, mas ela estava lá. Não conseguia respirar. A todo o instante tinha vontade de gritar, de chorar, de correr e de me rasgar livremente entregando-me às tormentas do espírito. Lembro-me vivamente de chegar a casa, onde vivo sozinho, e sentar-me, de olhos vagos e perdidos. Maquinalmente, liguei o meu computador naveguei durante uma meia hora, distraído e magoado.
Depois, não consegui aguentar mais. As lágrimas escorreram-me pelas faces com uma volúptia que eu não conhecia. Arrastei-me para o meu quarto onde me afundei na cama e dei largas à minha tristeza. As horas passaram e só as lágrimas generosas e a minha tristeza intocável me mantinham companhia. Foi uma hora negra, uma hora do mais profundo desespero. E eu sei que é pretensioso da minha parte estar a descrever estas coisas, quando há tanta boa gente por aí que tem tormentas gravíssimas quando comparadas com as minhas maleitas. Mas, ai! Sou tão egoísta!
Chorei, chorei como nunca me tinha deixado. Entre cada soluço e cada suspiro, via a sua face, lembrava-me da sua voz e dos seus vivos olhos negros que tanto me assombravam. Recordava a sua voz. Inovacava a sua presença. Poucos imaginariam que pudesse ser tão cruel conhecer a verdadeira beleza, mas esquecendo-se que isso implica também para mim perceber que jamais possuiria a criatura que mais amo neste desconsolado mundo. Triste dia, triste dia!
E hoje, como me sinto?
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